Tudo bem, o céu nublado descarta qualquer chance de dizer: o dia está lindo. Isso para alguns, porque para mim, por exemplo, dia lindo não é só aquele com sol de rachar e um céu azul sem nuvens. Dia feio também é bonito, oras. Mas lá, os dias quase sempre são assim, cinzas e sombrios. O que pode causar desespero.
Aquele cinza sem cor pode ainda ser pior. Porque tentar ver a rua, já de uma feiúra honesta, e ainda enfrentando uns pingos de chuva mal formada na cara, pode ser triste e melancólico. Ou feliz, bem lá no fundo. Mas ainda assim, sempre melancólico. E os pingos quase sempre estão lá. Não é à toa que é conhecida como “terra da garoa”.
Suas meninas também não são donas de beleza incontestável. Exibem uma certa palidez e as bundas não costumam sair assim, sozinhas, requebrando por aí. Beleza, nesse caso, só a interior. O resto é exceção.
O concreto é a parte mais sincera. Afinal está ali apenas para deixar tudo mais desbotado ainda. Goste quem quiser. Arrancou à força todo o verde que ali existia, e o verde que restou nem verde é mais.
Alguns disseram certa vez que era também o túmulo do samba. Como se já não bastasse ser o túmulo de tantas outras coisas, de gente castigada, por exemplo. Quem disse isso só podia estar de mau humor. No fim, uma das poucas belezas que ainda guarda é a da música soprando bem alto e empurrando o povão pra frente.
Esse mesmo povo que enfrenta filas, ônibus lotados e mora num barracão. Quando não estão passando fome estão dormindo debaixo da terra, soterrados. Ainda têm a ousadia de dizer que são felizes. Talvez não conheçam a verdadeira felicidade, ou nem queiram. Eles sorriem e na boca há menos dentes do que esperança.
Mesmo quem consegue algo, sofre. Experimente enfrentar a fúria dela em determinados horários. Ouvirá um grito furioso, em um tráfego de enlouquecer.
E teima em crescer, mesmo onde não há mais espaço.
Vive aos trancos e barrancos, mas é feliz. Talvez seja um retrato de todo brasileiro. Ou de uma parcela. É certamente uma parte de cada cidadão. Acolhe, mas também expulsa. É preciso amá-la ou deixá-la. Lá, não tem meio termo.
Por mais que ela tente me desmentir, acredite: é sim o centro do mundo, e olhada de perto, bem de perto mesmo, é toda linda. Como uma moça em plena juventude. Vicia.
Parabéns, São Paulo, por seus 456 anos! És a cidade mais honesta do Brasil
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