Como deve ser triste ser essa gente que, para não perder a postura ideológica, renega a arte, a poesia e até a própria alma do país. Para essas pessoas, a grandeza de um Brasil que conquista o mundo é a grande ameaça.
Recentemente, comemorei o fato de que o filme Ainda Estou Aqui finalmente chegaria aos cinemas da nossa cidade. Vamos poder assistir ao longa tão celebrado. Comentando o fato com alguns conhecidos, um deles respondeu prontamente, de forma irôica: "Não posso deixar de perder!” Nunca viu o filme e nunca vai ver. Me pergunte sobre o perfil do cidadão. Isso mesmo, não preciso nem descrever, você já sabe.
Uma vez escutei de alguém que seguir cegamente uma ideologia política e, consequentemente, todas suas práticas e opiniões, sem questionar, é o mesmo que sempre ter a resposta pronta antes mesmo de receber a pergunta. Você não tem a liberdade de pensar, de analisar, de ter a sua própria opinião. Você se apropria sempre da opinião do outro. Uma verdadeira prisão, não? E o mesmo vale para os aplausos e as vaias que você decide emitir
O filme Ainda Estou Aqui é um fenômeno, o grande do momento. Só para relembrar alguns poucos fatos: a atriz principal, Fernanda Torres, recebeu um Globo de Ouro como melhor atriz de drama, derrotando as atrizes Pamela Anderson, Angelina Jolie, Nicole Kidman, Tilda Swinton e Kate Winslet. Só isso. O filme não só foi indicado para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro como também para o prêmio principal de Melhor Filme, feito inédito para uma produção brasileira. Só a indicação em si já é uma vitória. E Fernanda está lá de novo, concorrendo como melhor atriz. O filme lidera as bilheteiras nos cinemas do Brasil, tem sido falado no mundo inteiro, Fernanda mesmo deu várias entrevistas para programas tradicionais dos Estados Unidos e de outros países.
Mas o que o cidadão de bem vê? Aquilo que os colegas de ideologia mandam ele ver: o sucesso do filme como uma grande ameaça. Afinal, a obra trata de um período sombrio do nosso país, mas que, para ele, foi uma época plena e feliz e que, por isso, deveria voltar. Ele está tão preocupado com o bem da nação, coitado, que teve que correr para plantar a informação de que o Globo de Ouro de Fernanda foi comprado pelo governo federal. Não funcionou. Então, ele correu para espalhar o vídeo da Fernanda fazendo blackface há dezessete anos, em um quadro do Fantástico. Estranho, já que normalmente ele é contra esse tipo de represália, que ele considera um grande “mimimi”, mas talvez, nesse caso, seja mesmo imperdoável. Como Fernanda merece ser celebrada quando cometeu um ato falho desse, há dezessete anos?
Deve mesmo ser muito triste ser essa gente. Não se comover com a arte, não poder dar nem uma chance para celebrar o que é belo e o que é nosso, aprisionados em suas certezas ideológicas. Ser obrigado a odiar algo mesmo antes de experimentar e ter esse ódio elevado somente porque esse algo foi feito na nossa casa, confirmando sempre a sua síndrome de vira-lata. Já imaginou se comover mais com a vitória de Trump do que com a de Fernanda? Triste e chato viver assim.
O filme Ainda Estou Aqui é, para muitos, um espelho de nossa própria vergonha — e como todo espelho, incomoda quem prefere se olhar de uma outra maneira.
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