Confesso: odeio os singles.
Estou falando das músicas avulsas que são lançadas a todo instante nas
plataformas de streaming. Pode me chamar de antiquado, talvez eu seja mesmo.
Tenho conta no Spotify, assino YouTube Premium, mas amo minha vitrola! E tenho
uma saudade imensa da época em que só se lançavam álbuns inteiros, conceituais,
em que a obra transcendia as músicas.
O artista nos entregava uma experiência imersiva, quase cinematográfica, muito além de apenas uma coleção de faixas. Assim como um livro, um filme, um roteiro completo, que fazia sentido no todo. Já foi difícil abrir mão dos encartes, aquela parte visual da obra que se conectava diretamente com a sonora – os detalhes gráficos, fotos, capa, tudo muito pensado. Além das letras e das fichas técnicas que podiam ser consultadas a qualquer momento.
Claro, o mundo mudou. A transição do vinil para o CD, e depois para o streaming, foi uma revolução na indústria musical, e eu sei que, de certa forma, essa mudança trouxe muitos benefícios. Com o Spotify, por exemplo, tenho acesso a praticamente qualquer música a qualquer hora, na palma da mão. Economizo tempo e dinheiro, pois costumava comprar muitos CDs – com o que torrei de dinheiro nas Saraiva, Fnac e Americanas da vida, talvez hoje conseguisse comprar um terreno em Cacimbas do Sul. Agora pago uma mensalidade fixa, equivalente ao preço de um CD, e tenho todos os CDs que quiser ao meu alcance.
Apesar da conveniência, algo se perdeu nesse caminho, e foi a profundidade
artística. Os estudiosos dizem que é preciso se atualizar e entender que a
dinâmica da coisa toda mudou. O mercado é assim, e quem não acompanhar fica
para trás. Então todo mundo – ou quase todo mundo – acompanha.
A música hoje é reflexo da geração TikTok, com atenção curta e foco disperso. Esse texto mesmo não deve ser lido até o final por quase ninguém. Se você for um dos poucos, me dá um alô, por favor, pra eu saber que não falhei totalmente.
Sem parar para pensar muito, me lembro facilmente do Clube da Esquina, do Lo Borges e Milton Nascimento, de 1972, do V, da Legião Urbana, de 1991, do Coisa Mais Maior de Grande, do Gonzaguinha, de 1981, do Alucinação, do Belchior, de 1976, do Memórias, Crônicas e Declarações de Amor, da Marisa Monte, de 2000, o Roberto Carlos, de 1978. Além de muitos, muitos, muitos outros discos que fizeram minha cabeça. Hoje, ao invés do lançamento de álbuns como esses, somos atropelados a todo instante por lançamentos de singles que se perdem no mar de tantas outras novidades.
Claro, ninguém está impedido de continuar lançando álbuns, alguns artistas,
inclusive, o fazem. Nando Reis teve a ousadia de lançar um álbum triplo ano
passado. Porém, a tendência do momento é o tal do single.
O fast-food da música. E fast food demais enjoa
e faz mal.
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