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A mulher perfeita

A mulher perfeita tem um único defeito: a perfeição.

A mulher perfeita não tem o charme de uma tristeza contida.
A mulher perfeita se acomoda em sua beleza.
A mulher perfeita nasceu para ser observada. Com dom para manequim.

Transgredindo Vinicius: desculpem as belas, mas beleza não é fundamental. Sou muito mais o encanto da imperfeição.

A beleza da mulher não está nos pés. Está no jeito de andar.
A beleza da mulher não está nos cabelos longos. Está no jeito como ela os acomoda por trás da orelha.
A beleza da mulher não está no sorriso. Está no som que ela faz quando ri.
A beleza da mulher não está no que ela escancara. Está no que ela esconde.

Mais vale um rosto interessante que um rosto bonito.

Nas mulheres por quem me encantei o que chamava atenção não era o óbvio. Era o detalhe. Quando ela acordava e vestia a primeira camisa que encontrava (quase sempre a xadrez com o azul predominando) e amarrava o cabelo alto num coque, era quando mais a amava. Os dois gestos em sintonia provocavam em mim um êxtase. Ela nem desconfiava. Seguia nas tarefas da manhã como se nada estivesse acontecendo. Por dentro eu gritava. Lá dentro eu me contia. Dentro de mim nascia poesia.

E é quase sempre assim. A mulher fisga o homem pelo que ela mesma não percebe.

A cara da manhã. O moletom velho. Tudo fica bem, enquanto ela tenta contrariar a admiração: "não me olha, estou horrível".

Não é o corpo perfeito. É tua a pele.
Não é a boca. É a tua voz.
Não é o perfume. É o teu cheiro.

A mulher perfeita, para mim, é a que sabe usar suas imperfeições.

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