Tem aquele filme do Woody Allen em que o protagonista, durante uma viagem a Paris, se lança solitário por passeios noturnos pela cidade-luz e descobre, ao badalar da meia-noite, ser transportado para a década de 1920, época que considera a melhor de todas. Ao embarcar nessa viagem ao passado, ele se encontra com artistas e intelectuais que admira e com os quais já havia tido contato pelos livros e demais obras, já que um encontro pessoal, até então, era impossível devido ao muro do tempo. A viagem é regada a festas com F. Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway e Salvador Dali, entre outros.
Gostaria de ser esse personagem de Woody Allen e viver uma experiência parecida. Mas, sem dúvida, meu destino seria outro: Rio de Janeiro, início da década de 1960. Mais precisamente, a Rua Barata Ribeiro, bairro de Copacabana. Número 716. Para ser ainda mais exato: o apartamento de Domingos de Oliveira.
Explico.
Assisti há alguns dias o último filme do diretor carioca, o excelente Barata Ribeiro 716. Nele, Domingos resgata os dias em que viveu no famoso apartamento em Copacabana, no início dos anos 1960. É um filme autobiográfico, portanto. Nessa época, pré-golpe militar, Domingos lotava seu apartamento e emendava festas regadas a muito álcool. No filme, Domingos é Felipe, interpretado por Caio Blat, que está genial no papel. Felipe tenta escrever um livro enquanto vive bêbado, de álcool e de amor, apaixonado pelas belas meninas que frequentam suas noitadas.
No filme, Felipe filosofa. Felipe chora. Felipe sofre de amor. Felipe se apaixona de novo. Pelas mulheres e pelos seus amigos. Felipe vive. Intensamente. De acordo com o que acredita. Por mais que o caminho não lhe pareça plano, ele segue em frente. Pois para ele, faz todo o sentido. O resultado é que você não vê saindo da tela um filme óbvio, tampouco uma história linear. O que você vê saindo da tela é amor. Isso mesmo e simples assim. Amor pela vida. Pela vida e tudo o que ela é capaz de nos oferecer. Amor daqueles que embriagam.
Domingos é um entusiasta da vida e deixa isso explícito em todas as suas obras. Por isso, retratando ele mesmo no auge de sua juventude, seria natural o nascimento de um personagem como Felipe. O mesmo amor que ele sentia nos anos 1960 ele mantém intocado até hoje, caso contrário não seria possível ter feito o filme que ele fez. Ao menos não com a sinceridade com que a história chega até nós. Domingos está no auge dos seus 80 anos e mantém sua juventude intacta, é impressionante e inspirador.
Dividindo com a gente essa passagem de sua história, Domingos nos lembra que as pessoas, mesmo sendo diferentes, sempre têm muito a oferecer e ensinar. Não precisamos pensar da mesma forma para compartilharmos a experiência da vida. O mundo poderia se parecer um pouco mais com o seu apartamento na BR: cheio de pessoas com os mais diferentes gostos, filosofias e formas de vida e que, apesar de não serem iguais, permanecem unidas. Essa é uma lição valiosa em tempos de polarização e individualismo. Dias de “pensou diferente, virou meu inimigo”.
Por isso, se eu pudesse, viajaria no tempo como no filme de Woody Allen. Com um bloquinho na mão, escutaria Domingos (ou Felipe), filosofar sem parar e não perderia uma frase. E daria um recado a ele. Que ficasse tranquilo, pois iria conseguir aquilo que estava buscando naquele momento: viver de sua arte. Contaria que, anos mais tarde, ele mesmo faria um filme narrando aqueles dias e influenciaria outros jovens, de uma época tão distante. E muito mais do que isso, ensinaria a gente a viver melhor.
Depois disso, brindaríamos a vida. E brindaríamos o amor!
P.S.: agradecimento especial à produtora do filme, Renata Paschoal, pois sem ela não teria conseguido assistir ao filme estando tão distante do Brasil. Obrigado, Renata! Um brinde a você, daqui das terras geladas do Canadá!
Vou assistir a esse filme, indubitavelmente!
ResponderExcluirFelipe, porque não postou mais nada?
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