Hoje Gonzaguinha completaria 80 anos. Se, aos 45, seu carro não tivesse colidido com um caminhão, e ele não tivesse morrido na estrada, entre shows.    É um dos meus favoritos de todos os tempos. E vai além de suas canções. Sua persona sempre me foi marcante, e ele faz parte da minha formação — não só musical, mas como ser humano. Por me ajudar a entender a mim mesmo. Este é meu testemunho. E minha declaração a um dos maiores artistas que o Brasil já viu.   Suas canções, para mim, têm gosto de estrada. De terra vermelha. Daquele Brasil raiz, profundo, escondido, sofrido. Eu fui criado viajando de carro pra lá e pra cá, com mais crianças do que cintos de segurança no banco de trás. Outros tempos. Essa lembrança ficou em mim. Sempre amei a estrada: sair antes do amanhecer e viajar o dia todinho, cuidando das paisagens, parando para tomar um café de vez em quando. A experiência do deslocamento sendo mais significativa do que a chegada ao destino. Viajar de carro no Brasil, pra mim, é ...
Interrompi minha programação normal para encarar uma primeira sessão de psicanálise. Online. De dentro do carro. Estava bem vestido, me sentia resolvido, seguro de mim. Esperava tudo — menos ser arremessado nu no meio da rua. E, como se não bastasse, atropelado logo em seguida. Na hora, não doeu. Mas acho que vai doer.   Como alguém que nunca fez análise, eu não sabia muito bem o que esperar. Recebi a indicação de uma boa terapeuta e nem me preocupei em investigar primeiro qual o ramo da psicologia — ou da psicanálise — ela praticava. No íntimo, eu contava com afagos e aconchego. Por cinquenta minutos, estaria livre para compartilhar o que bem entendesse com alguém pronto para me dar colo, mesmo que online. Afinal, minha filha, quando vai para suas sessões de terapia, tem uma sala inteira de brinquedos só pra ela — atividades reconfortantes, como num spa para a mente. Era isso que eu buscava, mesmo sem saber.     Na hora da apresentação inicial, quando perguntado por que a procurei...